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Bernard Cornwell e a ficção-histórica

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Capa do artigo: Bernard Cornwell e a ficção-histórica

Já ouviu falar em ficção-histórica? Uma pesquisa rápida na Wikipédia nos diz que:

Ficção histórica ou drama histórico é um sub-género de ficção que retrata muitas vezes figuras ou eventos históricos. Gênero histórico mas ao mesmo tempo fictício, faz uma honesta tentativa de capturar o espírito, as condições sociais da pessoa ou da época, que representam a atenção ao pormenor e fidelidade.

Ou seja, qualquer livro, filme, série, novela que se passa no passado é uma obra de ficção-histórica. Nesse artigo, no entanto, usarei o termo ficção-histórica como sinônimo de literatura de ficção-histórica.

A ficção-histórica é produzida para entretenimento, e visa primeiramente criar uma estória cativante e divertida. O papel dela não é ensinar história, logo algumas modificações podem ser feitas: fatos e datas podem ser alteradas e personagens históricos importantes podem ser ignorados ou modificados. Alguns autores de ficção-histórica tem o costume de fazer uma breve "Nota histórica" ao final de seus livros, para esclarecer quais foram as principais modificações e garantir que o leitor não acredite em ideias e eventos que não foram reais. Essa é uma boa prática, mas infelizmente não é tão comum quanto deveria.

Mas a ficção-histórica com certeza têm muitos pontos positivos: ela transporta o leitor para o passado, e faz com que ele viva os eventos de outros tempos de uma forma muito mais real do que qualquer livro de história seria capaz de fazer. Essa costuma ser uma das críticas das pessoas que estudam história. O fato de que o passado parece morto demais, e de que é muito difícil imaginar como a vida poderia ser naquelas condições.

A ficção-histórica contribuí exatamente nesse ponto. Ela dá vida a história, faz com que nos apaixonemos por pessoas que viveram séculos atrás, e permite que compartilhemos suas paixões, seus medos, suas desilusões, seus sonhos.

Quando eu tinha 19 anos eu já gostava muito de história, mas algo ainda me bloqueava. Não sabia se era à isso que queria dedicar a minha vida. Então um dia eu, um fã da lenda Arturiana desde criancinha, decidi ler a trilogia de Bernard Cornwell sobre o Rei Artur. A partir daquele dia eu sabia que história era tudo que eu queria para a minha vida. Eu já havia assistido dezenas de filmes de ficção-histórica, mas nada havia me transportado para o passado de forma tão real e vívida quanto a literatura de ficção-histórica. Foi a obra de Bernard Cornwell que me colocou no caminho sem volta da história.

Durante o tempo em que estive na faculdade, li praticamente toda a obra do autor e estava tão fascinado que criei um site dedicado a ele. Durante 6 anos eu mantive o site Bernard Cornwell Brasil, que era um site voltado para a ficção-histórica. Tal foi o papel que a ficção-histórica desempenhou na minha formação.

O site Bernard Cornwell Brasil (2006-2012).

Bernard Cornwell e sua obra

Mas quem é Bernard Cornwell e o que torna sua obra tão especial?

Bernard Cornwell é um escritor inglês com uma prolífica obra de ficção-histórica. O autor tem uma predileção pela história de seu próprio país, então praticamente todas as suas obras tratam de grandes eventos da história britânica.

Cornwell em sua biblioteca e local de trabalho.

Cornwell é um dos escritores de ficção-histórica mais famosos do mundo e, acredito eu, o mais famoso no Brasil. Sua obra se destaca por ser voltada para as grandes guerras e grandes batalhas, ele é um apaixonado pela história militar, e se tornou reconhecido por ser um dos melhores recriadores de batalhas da literatura. Não apenas por seu vasto conhecimento da história das armas e dos combates, mas também por ser capaz de colocar nas páginas as emoções sentidas pelos que lutavam, e por reproduzir em detalhes sangrentos os aspectos mais aterradores das batalhas.

Mas mesmo quando distante dos campos de batalha, Bernard Cornwell mostra ter uma boa percepção da mentalidade dos homens de cada época. Uma intensa pesquisa histórica também permite a ele recriar detalhes do cotidiano que acrescentam veracidade ao passado.

Outra característica marcante da obra de Bernard Cornwell, é o costume que o autor tem de criar um personagem fictício que teria vivido no período tratado na estória, e mostrar os fatos a partir do ponto de vista desse personagem. Esse é um aspecto muito positivo da sua obra.

Ao fugir do clichê cometido pela maioria dos autores, de mostrar os eventos do ponto de vista dos grandes líderes, o autor tem mais liberdade para mover a estória do seu personagem ao seu bel-prazer, e usar os eventos históricos reais como plano de fundo, sem a necessidade de destruir completamente os eventos e personagens da história real. Algo que muitos escritores não demonstram pudor algum em fazer.

O fato de todas as suas obras contarem com um mapa e uma "Nota Histórica" bastante detalhada, também qualifica o autor no meu ponto de vista. É uma demonstração de cuidado e preocupação com a precisão histórica, algo que só um verdadeiro apaixonado por história se daria o trabalho de fazer.

Bernard Cornwell já escreveu sobre diversos períodos históricos. Para os interessados em sua obra vou fazer uma descrição rápida dos principais trabalhos do autor.

A Trilogia As Crônicas de Artur

As Crônicas de Artur é uma tentativa de reconstruir a figura de Artur, que através dos séculos se transformou no lendário rei Artur. A partir de fatos e em cima de uma das teorias mais comuns entre historiadores, Bernard Cornwell criou uma romance sobre a Britânia e a invasão dos saxões, após a saída dos romanos. Nesse cenário conturbado teria surgido a figura de Artur, um líder capaz de unir os bretões em uma última tentativa de barrar o avanço saxão.

A série é composta de três livros, totalizando cerca de 1500 páginas e é, sem dúvida, uma das mais famosas e aclamadas obras do autor. A estória é narrada em primeira pessoa por Derfel Cadarn, um personagem fictício que acompanhamos desde a infância até a velhice.

Quando jovem ele se junta ao exército bretão, luta contra os saxões e se torna um dos amigos mais próximos de Artur. A história é contada por ele muitos anos depois quando se recorda dos detalhes de sua juventude e escreve sua história em pergaminhos, enquanto vive em um mosteiro.

O livro também aborda outro aspecto interessante que foi o conflito entre paganismo e cristianismo, quando a religião cristã ainda dava os seus primeiros passos.

Livros da Trilogia As Crônicas de Artur - O Rei do Inverno, O Inimigo de Deus e Excalibur.

A Trilogia A Busca do Graal

Em A Busca do Graal, acompanhamos a vida do arqueiro Thomas de Hookton durante a primeira fase da Guerra dos Cem Anos no século 14. Uma das primeiras batalhas reconstruídas nos livros é a batalha de Crécy, uma grande vitória inglesa em agosto de 1346. Além de descrever em detalhes a questão militar e mostrar o cotidiano das pessoas no final da idade média, os livros também apresentam temas como a Inquisição medieval, as relíquias e a corrupção da igreja. Tudo isso com uma dose certa de humor, suspense e aventura.

Essa série de livros tem mais de 1200 páginas e é narrada em terceira pessoa.

Livros da Trilogia A Busca do Graal - O Arqueiro, O Andarilho e O Herege.

A série As Crônicas Saxônicas

Essa série começou a ser lançada em 2004 e se tornou um sucesso imediato. Em As Crônicas Saxônicas, Bernard Cornwell repete a fórmula que fez tanto sucesso em As Crônicas de Artur, nos colocando dentro da mente do personagem principal para acompanhar a estória de Uhtred, um saxão nascido na aristocracia da Northúmbria do século 9, que acompanha o início das invasões vikings na Inglaterra, e vê o reino de seu pai ser conquistado.

Separado de sua família ainda criança, ele é criado por soldados dinamarqueses e aprende os modos de vida viking: seu estilo de luta, sua religião, seus costumes e sua visão moral. Mas sem nunca perder de vista o seu objetivo: recuperar a fortaleza de Bebbanburg e voltar a ser o senhor da Northúmbria.

Nessa série, sabemos desde o início que Uhtred sobreviveu a todos esses conflitos e já está na velhice escrevendo as suas memórias. Os livros são narrados em primeira pessoa, e isso faz com que o leitor mergulhe na história e nas ideias desse período de maneira muito mais profunda.

A série Crônicas Saxônicas e os 10 livros da série já lançados no Brasil.

Em 2015, essa série de livros começou a série adaptada para a televisão, com o nome de The Last Kindgom (O Último Reino). A série já está na sua segunda temporada e pode ser acompanhada no Brasil pela Netflix.

A série As Aventuras de Sharpe

Essa é uma das séries mais famosas do autor e mais de 20 livros já foram lançados desde que a série começou a ser escrita em 1981. As Aventuras de Sharpe acompanha a carreira militar do personagem fictício Richard Sharpe, um inglês pobre que entra para o exército britânico no final do século 18 e participa das grandes batalhas de sua época.

A série começa com três livros sobre as guerras britânicas na Índia e prossegue narrando as Guerras Napoleônicas a partir da batalha de Trafalgar de 1805, até a derrota de Napoleão em Waterloo em 1815. A trama se foca em Richard Sharpe e seus companheiros de regimento, mas dá uma atenção bastante especial à carreira militar de Arthur Wellesley (futuro Duque de Wellington), o grande líder militar britânico do século 19, que começou a sua carreira na Índia e depois foi o comandante britânico na Guerra Peninsular.

O Duque Wellington, de Thomas Lawrence. Pintada em 1815–16, após a batalha de Waterloo.

Bernard Cornwell é um grande fã do Duque do Wellington, então contar as aventuras de um soldado nesses locais foi uma forma que ele encontrou de mostrar as campanhas de Wellington vistas de dentro, do ponto de vista dos soldados que ele comandava.

Essa série possui algumas características especiais. Cada livro é uma estória completa, com início, meio e fim. Então não há necessidade de ler os livros em uma ordem específica. Além disso, a série foi escrita completamente fora de ordem cronológica. Por exemplo: as primeiras campanhas de Sharpe em 1799 foram escritas pelo autor em 1997, enquanto o livro que trata da batalha de Talavera de 1809 foi escrito em 1981. Mas nada disso traz qualquer prejuízo para o enredo do livros.

Os 13 primeiros volumes da série já lançados no Brasil.

No começo da década de 90 a série Sharpe começou a ser adaptada para a televisão. 16 filmes foram produzidos entre 1993 e 2008, tendo o ator Sean Bean atuando no papel principal de Richard Sharpe.

Sean Bean como Sharpe em cena de um dos filmes da série.

Outros livros de Bernard Cornwell

Além das famosas séries citadas acima, Bernard Cornwell também escreveu alguns livros individuais: O Condenado, que mostra uma investigação para tentar salvar um homem condenado a forca na Inglaterra do século 19. Azincourt, que narra uma das mais famosas batalhas na Guerra dos Cem Anos que ocorreu em 1415. O Forte,  que trata de uma vitória inglesa na Guerra de Independência Americana, que ocorreu em uma batalha naval em 1799 em Massachusetts. E, por fim, 1356, que retrata a batalha de Poitiers, outra grande vitória inglesa na Guerra dos Cem Anos.

Outros livros de Bernard Cornwell publicados no Brasil - O Condenado, Azincourt, O Forte, 1356.

O autor também escreveu a série Starbuck, sobre a Guerra Civil Americana. Dessa série, os dois primeiros livros (Rebelde e Traidor) também já foram lançados no Brasil.

Nem só de Bernard Cornwell vive a ficção-histórica

A ficção-histórica é uma área muito ampla da literatura, e há muitos autores dignos de nota. Por isso, o nosso site conta com uma seção especial com um grande banco com livros e autores, assim é possível fazer uma pesquisa detalhada sobre o os livros de ficção referentes a diversos períodos históricos. Clique aqui para acessá-la.

Eu ainda não li livros de todos eles, mas posso recomendar Philippa Gregory, C.C.Humphreys, Colleen McCullough, William Napier e o autor do meu romance histórico favorito, Harry Thompson, que escreveu a maravilhosa obra Nos Confins do Mundo.

Foto de membro da equipe do site: Moacir Führ
Escrito por Moacir Führ

Moacir tem 36 anos e nasceu em Porto Alegre/RS. É graduado em História pela ULBRA (2008-12) e é o criador e mantenedor do site Apaixonados por História desde 2018.

Fontes bibiliográficas
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